Depois de duas “comidas de bola” memoráveis dos membros Supremo Tribunal Federal (STF), que sob forte pressão da mídia e da opinião pública optaram por descricionariamente reinterpretar dispositivos que, no Código Penal (art. 287) e na Constituição Federal (Art. 226 § 3º), são claros e específicos – daí não passíveis de reinterpretação, eis que a Corte Constitucional brasileira volta finalmente a atuar conforme deveria: vai julgar mandado de injunção (CF, art. 5º, LXII) referente ao inciso XXI do artigo 7º da carta magna brasileira.
O inciso faz menção ao aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, que nada mais é do que o lapso temporal existente devido entre o momento em que o trabalhador é comunicado da sua dispensa do emprego e o último dia em que ele efetivamente desenvolverá atividades para seu empregador.
Eis o que diz o texto constitucional:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXI - aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei;
Como é natural em uma democracia onde há o direito à livre expressão, a notícia da atuação do STF em pouco tempo suscitou diversas manifestações, tanto contrárias como a favor da regulamentação do referido inciso.
Em geral, pelo que já li em jornais e meio eletrônico, bem como pelo breve debate que fiz com o colega administrador “geveniano” Rodrigo Baer, as manifestações contrárias se baseiam nos argumentos de que aumentar o aviso prévio significaria fazer crescer o custo das empresas, desestimular os empreendedores a contratar (ou a formalizar contratos) e incentivar os funcionários a “pedir a conta”. Sinto-lhes dizer, não poderiam estar mais equivocados.
Regulamentar o tempo de aviso prévio que deve ser dado ao trabalhador antes da sua dispensa não significa fazer a empresa gastar mais. Significa apenas que ela deve se planejar adequadamente.
Isso porque o que se paga ao funcionário é a indenização do aviso prévio, que só é devido quando a empresa não quer esperar o cumprimento do próprio aviso por parte do funcionário. Nesses casos ela o indeniza por mandá-lo embora mais cedo, para que o mesmo não fique desprovido de condições mínimas financeiras enquanto procura nova colocação no mercado. E a indenização, hoje, equivale ao valor do salário que o próprio funcionário receberia se tivesse ficado esse mês trabalhando.
Se o período de aviso prévio for aumentado, as empresas precisarão apenas se organizar melhor antes de dispensar funcionários que fazem parte do seu quadro trabalhista há 5, 10, 15 anos. Estes, que se dedicam boa parte da vida integralmente a apenas um empregador têm o direito de ser avisados com um período maior de antecedência antes de perderem totalmente sua fonte de renda, uma vez que não se espera que sua recolocação no mercado de trabalho se dê tão fácil como a de um outro funcionário que ficou menos tempo vinculado ao empregador.
Novamente, o empregador só teria despesas maiores se não se planejar e quiser que o funcionário pare de trabalhar antes do tempo devido, corretamente o indenizando financeiramente por isso (e eu não consigo conceber uma empresa que não consegue sequer se planejar, por exemplo, seis meses antes de terminar o vínculo com um funcionário – essas, dificilmente sobreviverão no médio prazo).
Regulamentar o aviso prévio em proporção ao tempo de serviço também não desestimularia as contratações, uma vez que, na verdade o lapso maior de aviso prévio só seria devido a funcionários com mais tempo junto ao empregador e, como se sabe, o ideal para as organizações é ter baixa rotatividade funcional (com raras exceções), o que significa exatamente estimular os trabalhadores a permanecer mais tempo na empresa. Afinal de contas, os custos para recrutamento, seleção e treinamento de funcionários são muito altos, e dificilmente o empregador trocaria o funcionário apenas para não ter que esperar um tempo maior em virtude do aviso prévio proporcional. As despesas para fazer isso seriam muito maiores!
Finalmente, regulamentar o aviso prévio também não serviria como incentivo para que os funcionários pedissem demissão com o motivo de aproveitarem o benefício. Como ele só é concedido quando o empregador é que dispensa, e em virtude de ser necessário maior tempo de vínculo empregatício para o seu usufruto, o aviso prévio maior funcionaria na verdade como um estímulo para os funcionários ficarem ainda mais tempo na organização, pois isso os garantiria maior proteção caso venham a ser dispensados no futuro (e qualquer outro tipo de “pedir a conta”, como acertos para acesso ao FGTS com devolução da multa paga pelo empregador, é fraude).
Cabe informar, depois dessa extensa digressão, uma curiosidade: segundo a legislação laboral do país, o trabalhador também deve aviso prévio ao empregador quando decide, por sua própria iniciativa, desligar-se da empresa. Nada mais justo, uma vez que a ambas as partes devem ser proporcionadas condições suficientes para planejamento, e não seria adequado o funcionário dizer que está indo embora no dia seguinte sem proporcionar ao patrão um tempo mínimo para substituí-lo.
Assim, eis os motivos pelos quais a atitude do Supremo em regulamentar o benefício do aviso prévio proporcional é correta, adequada e justa, além de não afetar economicamente a vida das empresas. Vamos esperar que essa ação incentive nossos legisladores a fazer o mesmo, já que na verdade o papel é deles, e é no Congresso que a população – e os trabalhadores – está devidamente representada.
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